Matricular em creche e pré-escola é o maior desafio na educação para os futuros prefeitos
Oferecer vagas em creches, garantir a matrícula na pré-escola, aumentar
o investimento e construir uma gestão democrática. São essas algumas
das principais tarefas que os novos prefeitos e futuros secretários de
educação dos 5.565 municípios brasileiros enfrentarão após as eleições
de outubro.
Pela legislação, os municípios são responsáveis pela matrícula na
educação infantil e também pelo ensino fundamental, em parceria com os
Estados. Hoje, são mais de 23 milhões de alunos nas redes municipais –
45,7% da educação básica do país. Segundo os especialistas, a maior
dificuldade de gestão se dá por conta do tamanho dos municípios: quase
90% têm menos de 50 mil habitantes e grande parte das cidades pequenas
vive de transferências, sem orçamento próprio.
O UOL ouviu 12 especialistas em políticas públicas
educacionais para saber os maiores desafios que os sistemas municipais
de educação apresentam hoje.
Abaixo, leia o ranking dos gargalos na educação municipal no Brasil:
1° Lugar:
Matricular as crianças de 4 e 5 anos na pré-escola
A partir de 2016, a matrícula entre 4 e 17 anos é obrigatória. O prazo
para adequação à Emenda Constitucional nº 59, aprovada em 2009, acaba
justamente durante o mandato dos próximos prefeitos. “Isso significa a
necessidade de mais recursos e planejamento para que a oferta garanta
não só o acesso, mas também a permanência e a qualidade”, lembra Gilda
de Araújo, professora do Centro de Educação da Ufes (Universidade
Federal do Espírito Santo). Hoje, os municípios detêm 74,6% do
atendimento da pré-escola no País – um total de quase 3,5 milhões de
alunos. “A educação infantil no Brasil ainda é algo novo. A legislação
avançou mais rápido do que a capacidade das prefeituras de atender a
demanda. Além disso, ainda não existe um projeto pedagógico claro”,
afirma o especialista em economia da educação da USP (Universidade de
São Paulo), em Ribeirão Preto, Daniel dos Santos.
2° Lugar:
Atender a demanda da creche
Apesar de não ser uma etapa obrigatória, o direito à creche está na
Constituição e vem provocando polêmica. A maior parte das matrículas é
dos municípios: 63,6% (1,4 milhão de crianças). No entanto, elas são a
minoria: em 2010, o número de matrículas era equivalente a 18,9% das
crianças de 0 a 3 anos. “Ainda enfrentamos a transição da creche como
unidade da assistência social para unidade da educação. Os municípios
fizeram isso em momentos diferentes e a cobertura não é homogênea”,
relata Marcos Bassi, professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná).
Segundo Cleuza Repulho, presidente da Undime (União dos Dirigentes
Municipais de Educação), as principais dificuldades estão nos custos de
manutenção. "Construir o prédio é o de menos, o problema é manter as
escolas", afirma ela, que também lembra que a contratação de novos
profissionais aumenta a folha de pagamento, esbarrando na Lei de
Responsabilidade Fiscal.
3° Lugar:
Melhorar a qualidade da educação
Com o ensino fundamental (1º a 9º anos) praticamente universalizado, a
discussão educacional sai do patamar quantitativo para o qualitativo.
“Precisamos discutir a qualidade da escola. Temos muitas avaliações
regionais e nacionais que dão o diagnóstico do sistema. Há a necessidade
de debater quais conteúdos curriculares queremos, observando o projeto
pedagógico das unidades”, afirma Andréa Barbosa Gouveia, professora do
curso de Pedagogia da UFPR.
Atualmente, o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) é a
"medida" da qualidade das escolas públicas. A cada dois anos, ele é
calculado com base no conhecimento dos alunos (Prova Brasil) e na taxa
de aprovação. Cada escola, cidade e Estado têm "nota" no Ideb. Para consultar o Ideb da sua escola, acesse a ferramenta que o UOL preparou.
4° Lugar:
Ampliação do tempo na escola
Aumentar o tempo na escola e oferecer educação integral são obstáculos
para as redes municipais especialmente por conta da falta de espaço e
dos custos. Embora pesquisas comprovem a relação entre maior exposição
ao conhecimento e bons resultados no aprendizado, a carga horária mínima
anual no País é de 800 horas distribuídas por um mínimo de 200 dias –
ou seja, 4 horas diárias. “As formas de expansão da educação integral
são diversas. Eliminar o terceiro turno e aumentar a jornada dos
estudantes são necessidades. Precisamos dar um atendimento mais completo
ao aluno, flexibilizando o currículo com uma infraestrutura didática
mais complexa”, diz Vicente Rodriguez, da Faculdade de Educação da
Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
5° Lugar:
Aumentar o investimento e efetuar o regime de colaboração
Pela Constituição, os municípios devem gastar no mínimo 25% da receita
resultante de impostos e transferências com a manutenção e
desenvolvimento do ensino. No entanto, segundo o Siope (Sistema de
Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação), em 2010 pelo menos
52 não atingiram o percentual.
Para Romualdo Portela,
da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo), o governo
federal precisa aumentar os repasses. “Os municípios têm mais encargos
hoje, mas também têm mais dinheiro, por conta do Fundeb (Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação)”, explica. “No entanto, o governo deveria
ampliar a ajuda às cidades mais pobres. O piso nacional dos professores
não será pago se não houver ajuda.”
Segundo os
pesquisadores, a secretaria de educação deveria assumir efetivamente o
seu orçamento. “É comum o dinheiro ficar com a prefeitura e o secretário
de finanças. Denúncias de desvio são recorrentes”, lembra José
Marcelino de Rezende Pinto, especialista em financiamento da educação da
USP, em Ribeirão Preto. Ele também lembra a importância do regime de
colaboração entre a União, os Estados e municípios, previsto na LDB,
para resolver questões que extrapolam o financiamento. “Com o ciclo I do
ensino fundamental a cargo do município e o II sob responsabilidade do
Estado, como ocorre hoje, o aluno passa por duas redes durante a vida
escolar. E não é raro um ente federado jogar os problemas para o outro.”
6° Lugar:
Promover uma gestão democrática
Dados do IBGE mostram que, em 2009, quase 80% das cidades tinham
conselho municipal de educação, instrumento considerado essencial para
ampliar a participação social na gestão pública. Para especialistas, a
transparência deve se dar tanto na secretaria de educação quanto dentro
das escolas, com eleições para diretores e diálogo com as famílias. “A
implantação de mecanismo de acompanhamento das políticas, por meio de
investimento nos conselhos de educação e do Fundeb, e também por meio de
uma aproximação com o Ministério Público e as universidades, pode
ajudar a instalar uma gestão mais democrática”, afirma Theresa Adrião,
da Faculdade de Educação da Unicamp.
7° Lugar:
Planejamento
Em 2009, segundo o IBGE, 3.138 cidades tinham plano municipal de
educação, documento que contém as metas da cidade para a área. Após a
aprovação do PNE (Plano Nacional de Educação), que apresenta os
objetivos do país na década e está em tramitação no Senado, os
municípios devem rever seus planos e, aqueles que ainda não têm o
documento, devem criá-lo. “O plano é uma política de Estado, não de
governo. Ele é fundamental para dar continuidade nas políticas públicas
da cidade”, explica Flávio Caetano da Silva, professor da pós-graduação
em educação da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).
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