Em uma sala de aula da educação infantil, todos os alunos
dormem. Todos, exceto Pedro, três anos, que fingiu estar dormindo para,
em meio ao sono coletivo, estragar trabalhos dos colegas, molhar seus
sapatos e colocar pais e escola frente a um dilema: o que fazer quando
uma criança passa dos limites? No caso ocorrido em São Paulo (SP), a
alternativa foi a expulsão - desfecho cada vez mais comum para crianças
cada vez mais jovens.
Nem sempre longas conversas entre professora e aluno funcionam. À
medida que o panorama piora, torna-se necessário chamar os pais e propor
o acompanhamento de um profissional. O problema é que a real gravidade
de certas atitudes - como incomodar a vida da professora, por exemplo -
dificilmente é compreendida por uma criança em seus primeiros anos de
vida. Expulsar da instituição de ensino não serve como medida educativa,
dizem especialistas.
"A expulsão não vale nem como punição, nem como medida educativa. Ela
só aumenta o problema, porque, quando a criança é expulsa da escola com
três, quatro anos, ela é prejudicada em seu processo de socialização",
diz o psicopedagogo Eugênio Cunha.
Para o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), do Rio de
Janeiro, a tarefa de educar deve ser dividida entre escola e família.
"As regras existem na sociedade. Se a criança não tem contato com elas,
se não é ensinada em casa, não vai agir diferente na escola. Desde cedo,
ela deve reconhecer a autoridade dos pais, para então reconhecer a
autoridade do professor", afirma.
No caso de Pedro, nome fictício para proteger a identidade do menino
citado do início da reportagem, as tentativas de corrigir a postura do
aluno com conversas e diálogo com os pais não deram resultado. Para não
prejudicar a turma, a família foi convidada a procurar outra instituição
de ensino. Apesar de acreditar que a expulsão não é a melhor
alternativa para casos semelhantes, a psicóloga Paula Pessoa Carvalho,
que acompanhou o caso, defende a instituição. "A escola não tinha como
lidar com essa demanda. É um caso atípico, em que é preciso lidar também
com os outros pais, que se perguntam por que o sapato do filho está
molhado, por exemplo. Uma decisão dessas é tomada porque a questão saiu
do seu controle", diz. Paula reforça que a expulsão é a medida final, à
qual se deve recorrer apenas quando as outras tentativas tiverem
falhado. "Não deve ser uma surpresa. A escola não deve expulsar na
primeira vez. Ela tenta contornar e, quando vê que fica difícil, toma
essa medida. Mas, antes disso, os pais é que têm de tomar uma atitude",
acrescenta.
Expulsão pode servir em casos de crianças muito agressivas
Cunha discorda enfaticamente da expulsão e afirma que evitar esse
desfecho depende de um esforço conjunto. "A educação se sustenta sob um
tripé, que é formado pela família, pela estrutura da escola e pela boa
formação dos professores. A solução está nesses três pontos. Quando se
institui a expulsão, se admite que todos fracassaram na educação daquela
criança", diz.
A pouca idade dos alunos também preocupa Paula. "A criança não
entende essa medida. O caminho começa antes, e deve haver conhecimento
da situação, para que ela possa ser contornada, inclusive com ajuda
profissional. A única coisa que o aluno entende é que está mudando de um
lugar para o outro", destaca. "Mas, às vezes, é necessária para
proteger os outros, principalmente se é uma criança extremamente
agressiva", acrescenta.
Quando não há o que fazer e a expulsão é consumada, o psicopedagogo
alerta: a criança não pode ficar longe da escola. "Em caso de expulsão, a
família deve dar todo o suporte ao filho, buscar compreender o que
ocasionou o problema e tentar resolvê-lo. É preciso buscar outra escola,
em que ele continue crescendo e aprendendo a conviver com os outros",
diz.